Brasil, um país com depressão?

Patricia Schlömer
Psicóloga Clínica - CRP 05/72073
5 minutos de leitura
imagem artista Mouni Feddag

Brasil, um país com depressão?

É no mínimo curioso que no país do carnaval 5,8% da população sofra de depressão, o que equivale a 11,7 milhões de brasileiros. Segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), 350 milhões de pessoas no mundo têm depressão. O que poucos imaginam é que o Brasil é o país com maior incidência da doença na América Latina, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Para se ter uma ideia, em parâmetros continentais, o país, tão reconhecido por seu povo alegre, perde apenas para os Estados Unidos, com seus 5,9% da população diagnosticada.

E mais, em um estudo recente, o Ministério da Saúde prevê que nos próximos anos até 15,5% da população brasileira poderá vivenciar a depressão ao menos uma vez na vida.

Por que a prevalência é tão alta entre os brasileiros?

Vemos nas mídias e em conversas informais, tantos supostos especialistas como pessoas leigas, tratando a depressão como uma espécie de cartilha de sintomas, na qual os indivíduos em sofrimento são quase que impelidos a se encaixar. Supunham ter uma definição ideal, quando não fantástica, do que é o transtorno, assim como soluções incríveis para todos os casos. Porém, esse é justamente o ponto nevrálgico do entendimento do fenômeno da depressão: são muitos os modos de sofrer, pois são muitos os modos de existir.

No entanto, é possível afirmar que a forte prevalência da depressão entre nós é em muito explicada pela dificuldade de acesso ao tratamento e pelo estigma social que ainda persiste em relação aos transtornos mentais em geral.

A OMS aponta para alguns aspectos interessantes quando o assunto é depressão:

- cresce no mundo todo, mas sobretudo em países mais pobres;

- acomete pessoas de todas as idades e níveis socioeconômicos, mas principalmente aquelas em situação de pobreza;

- apresenta relação com certos acontecimentos da vida, como o desemprego, o término de um relacionamento, a morte de uma pessoa querida, problemas de saúde e o consumo de álcool e outras drogas.

Em um país em que grande parte da população tem de trabalhar de forma exaustiva para conseguir garantir minimamente — quando conseguem — o acesso a serviços básicos, o resultado só poderia ser o esgotamento mental, condição propícia para o desencadeamento de transtornos como a depressão.

Em outras palavras, pessoas expostas a situações de vulnerabilidade social tendem a ter mais chances de diagnóstico e menos oportunidades de tratamento de qualidade. É claro que a profunda desigualdade social que acomete o país marca aqui também sua presença.

São mais suscetíveis homens ou mulheres? Jovens ou idosos?

Segundo a OMS, as mulheres apresentam duas vezes mais chances de desenvolver quadros depressivos do que os homens. Isso poderia ser explicado pelos menores níveis de testosterona, mas a verdade é que devemos olhar o fenômeno de forma mais abrangente a partir da lente do psicossocial, a qual nos permite enxergar que a mulher se encontra historicamente em uma posição de maior pressão social e vulnerabilidade.

Também entre os mais suscetíveis estão os jovens adultos, entre 18 e 29 anos, e os idosos. Dartiu Xavier da Silveira, psiquiatra e pesquisador da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) afirma:

“Trata-se de uma doença cuja gênese é multifatorial. Ocorre em decorrência da somatória de fatores diversos, tais como: predisposição genética, meio ambiente adverso ou hostil, relações interpessoais insatisfatórias, dificuldades em ser reconhecido dentro de uma comunidade. No entanto, quanto melhor for a qualidade de vida como um todo, menores serão as chances de uma pessoa desenvolver um quadro de depressão”.

Como já dito, cada pessoa experencia a depressão de forma diferente e em distintos níveis de intensidade. Os sintomas variam e alguns sinais, como irritabilidade e raiva, por exemplo, costumam ser mais comum entre os homens.

O filósofo e psicólogo Sergio Máscoli explica que desde tempos primórdios o corpo do homem era um instrumento de guerra, logo, não expressar emoção ou dor era uma virtude. Sua ira denotava força e coragem e, assim, a cultura foi internalizando emoções como irritabilidade e raiva como qualidades masculinas. Em contrapartida, homens sensíveis eram tidos como fracos e dispensáveis.

Isso explica a narrativa de que homem não sofre ou não pode sofrer. Porque “boys don’t cry” (meninos não choram), desde pequenos são ensinados a esconder ou negar, suas emoções, o que pode levar ao escamoteamento dos sintomas. O silêncio e a vergonha de procurar ajuda podem implicar em decorrências mais graves, como o suicídio.

Máscoli ressalta que é preciso mudar o paradigma sobre a condição do homem que vive agora em um tempo em que guerras são feitas por drones guiados por alguém do outro lado do mundo:

"Assim, o homem fica livre do papel de forte, corajoso, para viver outras experiências: ser humano, simplesmente. O homem que ainda é ensinado a ser forte e invencível pode viver muita angústia, e, consequentemente, muitos problemas psíquicos".

Estigma ainda é obstáculo

Por desinformação e preconceito muitas pessoas em depressão hesitam em procurar ajuda, acreditando, muitas vezes, que podem se “curar" sozinhas, por exemplo. Enquanto, na verdade, quanto maior for a falta de autonomia e de apoio, maiores serão as dificuldades para buscar tratamento. Além disso, o estigma pode ter como consequência um diagnóstico tardio, levando ao agravamento do quadro, gerando mais sofrimento para a pessoa e seus familiares.

Para Volnei Costa, psiquiatra membro da ABRATA (Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos), é imprescindível que a sociedade combata com firmeza o preconceito contra as questões relacionadas à saúde mental, sobretudo, em um país em que o número de diagnósticos é crescente:

“Por cerca de 16 séculos, os transtornos mentais ficaram retardos de serem cientificamente pesquisadas e ficaram no controle da igreja, que tratava os fenômenos de saúde mental como manifestações demoníacas. Isso cravou na percepção humana o entendimento que transtorno mental é algo errado, algo de quem não tem fé, é fraco ou não consegue se comunicar com o divino”.

Já ouviu falar no termo psicofobia?

Pois assim é chamado o preconceito contra as pessoas que convivem com doenças mentais. Predomina no senso comum, até os dias de hoje, que sofrimento mental é frescura ou falta de alguma coisa, como vergonha na cara, moral ou religião, como bem apontou o psiquiatra da ABRATA. Em grande medida, é esse tipo de postura que nos leva à posição de primeiro lugar como país com maior incidência de depressão na América Latina.

É urgente, portanto, uma profunda mudança de atitude em relação às questões relacionadas à saúde mental para que possamos reverter esse quadro tão triste quanto assustador. Para isso é preciso reconhecer o sofrimento, em nós e nos outros, como algo genuinamente humano, pois apenas por admiti-lo podemos lhe dar outros significados mais alegres.

Sobre mim

psicóloga clínica
Psicopedagoga
Educadora

Em minha longa jornada na Educação, conheci — e sigo conhecendo — adolescentes e jovens inspiradores. Foram eles que despertaram em mim o desejo de buscar compreender a complexidade humana, tão efervescente quanto encantadora nesta fase da vida. Conquistei, assim, minha segunda graduação em Psicologia e realizo atendimentos a adolescentes e adultos, nas modalidades presencial e online.

Experiência profissional

  • Especialista em Psicologia Clínica - NUCAFE

  • Especialista em Psicopedagogia - IBMR-RJ (Instituto Brasileiro de Medicina e Reabilitação)

  • Graduação em Psicologia - USU-RJ (Universidade Santa Úrsula)

  • Formação em Mediação de Conflitos Escolares - SEMED (Secretaria Municipal de Educação de Macaé)

  • Formação em Educação, Drogas e Saúde nas Escolas - Fundação CECIERJ (Centro de Ciências e Educação Superior do Estado do Rio de Janeiro)

  • Formação em Interfaces do Suicídio - CEPUERJ (Centro de Produção da Universidade do Estado do Rio de Janeiro)

  • Graduação em Letras - USU-RJ (Universidade Santa Úrsula)

  • Especialista em Língua Inglesa - PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro)

  • Atuação no Projeto Despertar - Núcleo de Assistência à Saúde Mental Casa Verde - Botafogo-RJ

  • Atuação junto aos casos de pessoas portadoras de transtorno mental usuárias de álcool e outras drogas.

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Perguntas Frequentes

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Não podemos determinar um tempo fixo para a terapia, pois é preciso respeitar as singularidades pessoais. Além disso, o tempo varia conforme a demanda, a frequência nas sessões e o vínculo terapêutico.

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Os atendimentos duram em média 50 minutos e ocorrem uma vez por semana em horário fixo. A frequência semanal é fundamental para a construção de um bom vínculo terapêutico.

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O primeiro passo é conversar com seus responsáveis e pedir que entrem em contato e deem o ok para agendarmos uma primeira conversa. Ali, vamos nos conhecer, e antes da primeira sessão, um dos responsáveis assina uma autorização e já podemos começar.

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